Sobre o assédio...

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ATENÇÃO!
O texto à seguir não é uma criação, tudo que você irá ler realmente aconteceu. Por favor, respeite!



Tudo aconteceu em um dia de sol. Era um dia até bonito e eu estava feliz, lembro de ter ido na escola, de ter conversado com os meus amigos e feito diversas atividades. Coisas de uma aluna comum que está cursando o primeiro ano do ensino médio. Acontece que naquele ano eu comecei a me descobrir, a revelar quem eu realmente era.  Assumi a minha verdadeira identidade e isso assustou algumas pessoas, afinal em nossa sociedade as pessoas ainda não estão acostumadas com diferenças e lhe julgam por qualquer coisa. Não vou dizer que foi fácil, pois não foi.
Minha mãe não aceitava ter uma filha que gostava de se vestir de preto e essas coisas. Isso fez com que tivéssemos muitas brigas e tudo virasse um inferno. Nesse meio tempo, além dessa crise de identidade eu estava passando por pesados problemas sentimentais que não contei para ninguém e resolvi esconde-los dentro de mim. Isso começou a me consumir de forma que eu temia a noite mais que tudo e comecei a acreditar que seres sobrenaturais me vigiavam a noite. Se imagine nessa situação, não foi fácil.
Como uma forma de “concertar” a filha problemática, minha mãe resolveu seguir os conselhos das minhas tias. Elas disseram que conheciam um moço que era muito religioso e tinha um dom, que ele ajudava a libertar as pessoas de coisas ruins. Minha mãe, como sempre foi uma pessoa religiosa, resolveu me levar até esse homem, para que eu fosse liberta dos meus demônios. Então nesse dia de sol, eu, ela e mais algumas pessoas da minha família fomos até a fazenda onde esse homem morava. Me lembro que não queria ir e que fui obrigada. Fui pensando que seria uma dessas casas de orações, mas não era. O lugar era uma grande fazenda, muito suja e só morava aquele homem lá.
Lembro de não ter gostado nem um pouco daquele homem. Nós entramos e sentamos na varanda, e assim ele foi fazendo as suas orações em cada um, um de cada vez. Mas, não foi na frente de todos. A pessoa que ia receber a oração tinha que seguir um caminho tortuoso no meio do mato até uma cabana estranha. Eu não queria ir, mas a fé da minha família me obrigou e assim, um pouco assustada eu fui. Foi a primeira vez que vi o mal em minha frente, ele fechou a droga da porta da cabana suja onde havia uma cama velha.  Aquele homem colocou a mão sobre a minha cabeça e fez uma oração, depois tocou os meus seios dizendo que isso era preciso, pois ele precisava saber que tipo de mal me afligia. Ele começou seu discurso.
–  Deus está me mostrando que há uma sombra dentro de você, e essa sombra está te consumindo. Ela vai te destruir aos poucos até não restar mais nada dentro de você. – Disse me fitando com um olhar que me aterrorizou.
– Como me livro disso? – Foi a única coisa que consegui dizer. Ele sorriu, eu estava com um misto de medo e raiva. Queria sair correndo dali, dizer para minha mãe que eu queria ir embora. Mas algo me prendia, acho que era o medo. Hoje penso que não deveria ter feito aquela pergunta, deveria ter ido embora, ou talvez deveria ter sido mais pulso firme e não ter ido até aquele lugar.
– A única forma de você ser liberta é se você deixar eu lhe tocar. – Suas palavras me mostraram que ele era uma farsa.  Senti nojo, repulsa. Ele estava querendo se aproveitar de uma garota de quinze anos. – Você tem que tirar a sua calça e deixar eu lhe tocar. – Foi o que ele disse.
– Não. – Dei um passo para trás, assustada e com vontade de chorar. Eu não sabia o que fazer, era nova demais, ingênua demais. Em minha mente uma grande confusão se formou, pois eu não sabia se ele estava dizendo a verdade ou se ele estava apenas querendo abusar de mim.
Assim, eu sai da cabana. Corri o mais rápido que pude e encontrei minha mãe. Pedi para ela para que fossemos embora, mas não contei o que havia acontecido, temi que ela brigasse comigo ou que ela me obrigasse a voltar e fazer o que ele havia pedido. Foi um erro não nego, ela jamais me obrigaria a voltar naquele lugar e teria tomado medidas drásticas. Nós fomos embora, mas não naquele momento, tive que ficar naquele lugar por mais umas horas.
Quando cheguei em casa, contei para minha mãe o que ele pediu para eu fazer. Não contei que ele tocou os meus seios por cima da roupa, estava muito envergonhada, me sentia suja. Ela ficou triste e eu também. Naquele dia minha mãe me abraçou e disse que eu nunca mais veria aquele homem, naquela noite eu não dormi, apavorada. Eu chorei a noite inteira e fiquei mal por dias. Mas, não havia acabado por ai.
Um tempo depois fui visitar a minha tia e ele estava na casa dela. Falou que queria fazer uma nova oração. Eu falei que não queria, mas fui obrigada  e ele me levou para o quarto da minha prima. Tentou tocar os meus seios novamente e falou novamente que teria que me tocar para me livrar das coisas ruins. Eu o empurrei, chamei de impostor e fui embora irritada e com medo. Depois disso ele falou para minha família que eu tinha um mal dentro de mim, todos acreditaram, menos minha mãe. Ela falou para eles o que ele tentou comigo, mas ninguém acreditou. Afinal ele era santo demais para fazer tal coisa.
Tempos se passaram e ele continuou a visitar a casa dos meus parentes. Eu nunca mais o vi, evitei o máximo e tentei esquecer todo o mal que ele me causou e o que poderia ter causado. Acontece que eu não pude impedir que ele tentasse algo com outras pessoas de minha família. Ninguém acreditou na garota que se vestia de preto e estava cheia de demônios, não acreditaram até ele tentar abusar de uma criança de sete anos.
Faz cinco anos que isso aconteceu e é a primeira vez que me abro. Que conto isso, e acho burrice da minha parte ter esperado tanto tempo. Quem garante que ele não tenha feito mal a outras pessoas? Mas, quem ia acreditar em mim? É assim que muitas vítimas de estupro se sentem. Eu não fui estuprada, porque eu pensei, por causa do meu ceticismo. Mas, e se fosse uma garota religiosa que acredita em deus acima de tudo? Será que ela teria deixado, será que ela teria se rendido as palavras daquele falso? Eu não duvido. Não devemos nos calar diante a isso, não foi e não é só comigo que isso aconteceu, isso aconteceu e acontece com quase todas as mulheres e isso é deprimente. Até hoje eu sofro por causa desse acontecimento, as lembranças me machucam e eu penso que deviria ter dito no momento que aconteceu, devia ter exposto aquele homem, mas eu não fiz.

Diante das situações que vivemos nos dias atuais não é seguro mais em local algum. Espero que aquela garota que foi violentada por vários homens (até onde sei foram 33), encontre paz. Sei que não vai ser fácil para ela esquecer aqueles momentos de aflição e desespero. Espero que todas as mulheres que sofreram e sofrem esse tipo de abuso, criem forças para gritar para os quatro cantos, denunciem. Não guardem isso dentro de vocês como eu fiz, isso machuca e quem pratica esse tipo de barbaridade merece ser duramente punido.

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